quinta-feira, 24 de março de 2011

Tradução, por favor...


«O anuário pontifício relatava, há poucos dias, que os cristãos católicos tinham aumentado substancialmente em todo o mundo, facto que não correspondia ao que se passa na Europa, onde o seu número estava a diminuir. O mesmo se diga às vocações sacerdotais e religiosas que manifestam a mesma tendência de subida em todos os continentes, excepto no europeu, onde a Igreja se debate com uma falta acentuada de clero e de religiosos.
Atendo-nos apenas aos números, que nem sempre são indicadores da vitalidade das comunidades cristãs, teremos de nos perguntar o que se está a passar com a relação da Igreja e, portanto, da fé cristã, com a Europa, o mesmo que é dizer com a cultura dos europeus.
Do ponto de vista da evolução cultural, o fenómeno de secularização vem já de há alguns séculos. A época moderna e contemporânea caracterizadas por uma concepção do homem e do mundo vistos a partir do progresso cientifico, pelo positivismo e pela exaltação da razão como único meio de conhecimento, levaram, senão ao afastamento, pelo menos à privatização da fé, nomeadamente da fé cristã. Neste contexto, tudo o que não seja materialmente verificável não merece credibilidade. Daí resulta que o inicio da época pós-moderna coincida com o chamado nihilismo, no nada. Dentro desta concepção, não há verdades absolutas, percorre-se a vida no relativismo e no individualismo, numa visão do homem sem qualquer relação com o seu Criador, numa apologia da liberdade sem a correspondente responsabilidade e sem horizonte de sentido humano, e numa exaltação da opinião individual que toma o lugar da verdade.
Neste percurso histórico que também se pode definir pela justa autonomia das coisas criadas, a que chamamos laicidade, que tem a sua origem na correcta compreensão do discurso cristão, passa-se ao laicismo que se define e actua como um conjunto de correntes de pensamento hostis à expressão pública da fé cristã.
A Igreja não é alheia a esta evolução histórico-cultural. Ela está situada no meio da sociedade e sofre as suas vicissitudes. Por isso, a par com a permanente exigência de evangelização, os problemas que se colocam à Igreja são os que provêm da cultura envolvente.

Olhando para o continente europeu, João Paulo II, na sua Exortação Apostólica A Igreja na Europa, diz que "na raiz da crise da esperança está na tentativa de fazer prevalecer uma antropologia sem Deus e sem Cristo" e, mais à frente, afirma que "a cultura europeia dá a impressão de uma 'apostasia silenciosa' por parte do homem saciado, que vive como se Deus não existisse". Daí, sublinha ainda o saudoso Papa que "estamos perante o aparecimento duma nova cultura, influenciada em larga escala pelos mass media, com características e conteúdos frequentemente contrários ao Evangelho e à dignidade da pessoa humana". Realça ainda mais os traços desta cultura, ao afirmar que dela faz parte "o agnosticismo religioso cada vez mais generalizado, ligado com um relativismo moral e jurídico mais profundo que tem as suas raízes na crise da verdade do homem como fundamento dos direitos inalienáveis de cada um». Sintetiza toda esta caracterização dizendo que estamos perante uma "cultura da morte" (n.º 9).
Também Bento XVI, na sua recente visita a Santiago de Compostela, em Novembro, do ano passado, colocava um conjunto de interpelações à cultura europeia. Dizia ele: "Como é possível que se tenha feito silêncio público sobre a realidade primária e essencial da vida humana? Como pode o que é mais determinante nela ser limitado à mera intimidade ou relegado à penumbra?" E, prossegue, afirmando que "nós homens não podemos viver nas trevas, sem ver a luz do sol. E, então, como é possível que se negue a Deus, Sol da inteligência, força das vontades e imã dos nossos corações, o direito de propor esta luz que dissipa todas as trevas?" Por isso, alerta o Papa, "é necessário que Deus ressoe jubilosamente no céu da Europa; que esta palavra santa nunca seja pronunciada em vão; que não seja invertida, fazendo-a servir para fins que não lhe são próprios".
A partir destas interrogações, o actual Papa lança o convite aos europeus nos seguintes termos: "A Europa deve abrir-se a Deus, ir ao seu encontro sem receio, trabalhar com a sua graça por aquela dignidade do homem que tinham descoberto as melhores tradições: além da bíblia, fundamental nesta ordem, também as da época clássica, medieval e moderna, das quais nasceram as grandes criações filosóficas e literárias, culturais e sociais da Europa."
Mas a par com a compreensão da evolução cultural da Europa, urge uma nova evangelização que se caracteriza no dizer João Paulo II por novo ardor, novos métodos e novas linguagens. Com esta finalidade, o Papa Bento XVI criou o Pontifício Conselho para Nova Evangelização com a Europa como destinatária privilegiada. A Diocese do Porto, com esta mesma finalidade, ensaiou, ao longo de um ano, o que chamou de Missão 2010, um conjunto de acções evangelizadoras que se integram nos objectivos e nos métodos da nova evangelização.
Sem um fundamento crente, é o homem que fica a perder. Por isso, João Paulo II diz que a Europa tem necessidade de uma dimensão religiosa.»
João Lavrador, bispo auxiliar do Porto no DN de 21 de Março de 2011.
Eu depois faço-vos a tradução.

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